A
Caxemira já foi considerada o "Paraíso na Terra". Hoje, depois de mais
de meio século de disputas pela posse do território, mais parece o
inferno. Nos últimos tempos, esse pedaço do subcontinente indiano voltou
a chamar as atenções do mundo: Índia e Paquistão — dois países com
poder de fogo nuclear — elegem o desejo de controlar o território como
motivo para discórdias e ataques intermináveis.
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A briga entre Índia e Paquistão pela posse da Caxemira começou com o final do controle britânico na região.
Região estratégica
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A Caxemira é uma região montanhosa, já no início da cordilheira do Himalaia. |
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Quando chegou à Caxemira, Jerangir, imperador mongol do século XVII,
disse: "Se existir um paraíso na Terra, ele fica na Caxemira". Uma
região de montanhas cobertas de neve, vales cortados por inúmeros rios,
terras férteis e riquezas minerais ainda não totalmente exploradas. Não é
à toa que tenha dado origem a uma briga que já dura mais de 50 anos.
Mas além de toda essa abundância, um outro interesse está em jogo: a
área é estratégica, pois faz divisa entre Índia, Paquistão, China e
Afeganistão. Para o Paquistão, a anexação da Caxemira a seus territórios
representaria uma fronteira direta com a China, sua aliada de longos
anos. Já para a Índia, a manutenção do controle da Caxemira impede o
fortalecimento de dois tradicionais inimigos em suas fronteiras. É claro
que as razões estratégicas não são explicitadas pelos governos em
questão. Oficialmente, o motivo central do conflito é uma disputa pelo
território. E o combustível é o conceito religioso.
Divisão do Império Britânico
Em 1947, após o movimento de resistência pacífica liderado por
Mahatma Gandhi, a Índia finalmente obteve sua independência da
Grã-Bretanha. O antigo território controlado pelos ingleses foi dividido
entre Índia e Paquistão — que eram, até então, um único país: os
territórios de maioria muçulmana ficaram com o Paquistão e os de maioria
hindu, com a Índia. Mas houve uma exceção: a Caxemira, governada na
época pelo marajá Hari Singh. O marajá pediu apoio ao governo hindu
contra grupos paquistaneses que começavam a invadir a região. Em
contrapartida, assinou um tratado anexando a Caxemira à Índia. Com isso,
deu início a um conflito que originou duas guerras entre Paquistão e
Índia: a primeira entre 1947 e 1948 e a segunda em 1965. Em 1999, por
alguns dias, a Índia bombardeou grupos apoiados pelo Paquistão que
haviam entrado em seus territórios.
A posição dos dois países
Segundo
o governo paquistanês, a Caxemira deveria fazer parte do Paquistão
porque a maioria de sua população é muçulmana e sofre perseguições dos
hindus. A Índia se recusa a discutir o assunto tanto com o país vizinho
quanto com a ONU e afirma que tem direito sobre a área, garantido por
antigos tratados. Existe, porém, uma terceira opção, que ganha cada vez
mais adeptos na própria Caxemira, mas que não é aceita nem pela Índia
nem pelo Paquistão: o estabelecimento da região como um estado
independente.
Linha de controle
Em
janeiro de 1949, depois do final da primeira guerra pela posse do
território, a ONU estabeleceu uma linha de controle monitorada por suas
tropas na fronteira entre os dois países: dois terços da região para a
Índia, um terço para o Paquistão. Essa linha, definida pelo Acordo de
Simla, atravessa os Himalaias, numa região a 5 mil metros de altura. Ao
norte da linha de controle, paquistaneses e hindus estão entrincheirados
desde 1984, numa região a 6 mil metros de altitude — o mais alto campo
de batalha do planeta, onde as condições extremas e o frio causam mais
mortes do que os eventuais tiroteios.
Tensão constante
Apesar da presença de tropas da ONU, a Caxemira continuou sendo um
foco de tensão. Grupos paquistaneses frequentemente se infiltram no
território hindu, organizando atentados. A Índia, por sua vez, acusa o
governo paquistanês de apoiar logística e financeiramente esses grupos
considerados terroristas. Após os atentados de 11 de setembro de 2001,
nos Estados Unidos, e o início do chamado "combate ao terror", a Índia
aproveitou para chamar a atenção mundial para a atuação desses grupos.
Em contraponto, o Paquistão nega envolvimento com terroristas e ainda
acusa a Índia de promover um "governo de terror", de repressão aos
muçulmanos na Caxemira. |
nuclear
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O que parecia uma briga de vizinhos
ganhou contornos ameaçadores quando Índia e Paquistão entraram para o
seleto grupo dos países que possuem armas nucleares.
Guerra Fria
As tensões na região da Caxemira têm um ingrediente a mais, que
torna o conflito preocupante para todo o planeta: tanto Índia quanto
Paquistão possuem armas nucleares. Como é possível dois países tão
pobres terem tanto poder de fogo? A resposta a essa pe1rgunta nos leva
de volta à época da Guerra Fria. A fim de barrar o avanço do comunismo
na Ásia, após a Revolução Chinesa, os Estados Unidos firmaram acordo com
o Paquistão. Em contrapartida, a União Soviética se aproximou da Índia.
Dessa maneira, os dois países receberam auxílio tecnológico das
superpotências para desenvolvimento de energia atômica "com objetivos
pacíficos". No final da década de 1950, o Paquistão inaugurou seu
primeiro reator nuclear.Mudança de aliados
Tratado antinuclear
Em
1996, Índia, Líbia e Butão foram os únicos países a votar contra o
Tratado de Proibição Total de Provas Nucleares na Assembleia Geral das
Nações Unidas.
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Após a guerra entre Índia e China, em 1962 — que teve a última como
vencedora —, chineses e paquistaneses se tornaram aliados contra o
inimigo comum. A partir daí, o Paquistão se afastou dos Estados Unidos e
passou a contar com auxílio chinês no desenvolvimento de um programa
nuclear para fins militares. Na década de 1990, os norte-americanos
suspenderam definitivamente o auxílio financeiro e a venda de armas ao
Paquistão. Em resposta, o país afirmou que daria continuidade às
pesquisas nucleares com ajuda exclusiva da China.Primeiros testes
Enquanto isso, a Índia também avançava em suas pesquisas nesse
campo. E, em 1998, fez os primeiros testes nucleares em seu território,
detonando três bombas no deserto de Rajastán, a poucos quilômetros da
fronteira paquistanesa. Poucos meses mais tarde, em resposta à atitude
hindu, o Paquistão também realizou seus primeiros testes. Como
consequência, o século XX terminou com mais dois "sócios" no restrito
"Clube Nuclear". Oficialmente, possuem bombas atômicas Estados Unidos,
Rússia, China, França, Grã-Bretanha, Coreia do Norte, Israel, Paquistão e
Índia.
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